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“Esperamos que os russos não mudem planos de vir ao Rio”

Seja Dilma ou Temer, contatos com Rússia serão mantidos, diz embaixador 
Foto:Vladímir Pesnia/RIA Nôvosti

22/07/2016

Em entrevista, embaixador do Brasil na Rússia, Antônio Guerreiro, fala sobre doping, segurança nas Olimpíadas, compra de armamento russo e futuro do país no Brics.

Em breve começarão os Jogos Olímpicos no Rio de Janeiro. A seleção de atletismo russa foi afastada de competições internacionais pela Iaaf devido a um escândalo de doping. O senhor acredita que a ausência de atletas russos será uma perda para os Jogos?

Antônio Guerreiro: Eu, pessoalmente, lamento muito que essa situação tenha acontecido. Todos nós sabemos que a Rússia é uma grande potência esportiva e que tem experiência considerável nos Jogos Olímpicos, incluindo vitórias no atletismo. Por isso, a participação limitada de esportistas russos em quaisquer competições é, sem dúvida, uma perda para o esporte mundial. Por outro lado, quero salientar que o Brasil está esperando ansiosamente a chegada de grande número de turistas russos. Tenho expectativa de que os russos que já planejaram a visita ao nosso país não mudem seus planos de vir para os Jogos, tanto ao Rio como para outras cidades que vão sediar competições.

Quantos torcedores russos são esperados no evento? O senhor considera que a ausência de alguns atletas russos provocará queda de interesse em competições e diminuição do número de visitantes em geral?

É bastante difícil prever o número de turistas e torcedores russos que visitarão o Brasil. É preciso lembrar que os cidadãos russos não precisam de vistos para visitar o Brasil durante 90 dias como turistas. Por isso, espera-se um grande fluxo turístico, mas ninguém pode dar cifras exatas. Em geral, estamos esperando pelo menos 500 mil visitantes estrangeiros, mas a quantidade pode chegar a 1 milhão. As competições acontecerão não só no Rio de Janeiro, mas também em outras cinco cidades. Estamos esperando turistas em cada uma delas e nos preparando para tal.

A saltadora em distância Daria Klíchina é a única representante do atletismo russo que recebeu a permissão da Iaaf para participar dos Jogos Olímpicos. Ela agradeceu à Iaaf por essa decisão, o que provocou uma onda de crítica e acusações por sua suposta falta de patriotismo. Qual sua opinião sobre a decisão da atleta?

Não posso avaliar nem comentar a decisão da atleta. Cada um tem responsabilidade por si mesmo. Eu entendo tanto sua decisão, assim como as eventuais críticas.

Às vésperas dos Jogos Olímpicos, o Estado do Rio de Janeiro está quase a ponto de colapso financeiro, não? Há boatos de que faltam recursos financeiros para garantir a segurança no evento. O senhor acredita que a segurança antiterrorista estaria sob risco?

Quero destacar que nos últimos anos o Estado do Rio de Janeiro recebeu muitas receitas orçamentárias vendendo petróleo. Quando os preços mundiais caíram, as receitas estaduais também diminuíram. Essa situação influenciou todos os aspetos de vida social, incluindo as áreas de educação, saúde e também segurança. A garantia de segurança é uma responsabilidade direta das autoridades estaduais, e não de prefeituras e municípios. Claro que a situação no Estado está bastante complicada, mas não creio que exista alguma ameaça para os participantes dos Jogos, porque, nessas circunstâncias, o Estado recebe ajuda por parte do governo federal. Estou certo que os organizadores dos Jogos garantirão o clima de hospitalidade e segurança absoluta para todos os participantes. Se lembrarmos da Copa do Mundo de 2014, sempre existem pessoas que gostam de fazer previsões catastróficas. A Copa foi realizada em um território mais amplo de que a Olimpíada agora. Naquele momento, também houve uma onda de comentários sobre eventual criminalidade, situação sanitária, logística e infraestrutura mal planejada. Mas, após o evento, mesmo os críticos mais ferrenhos reconheceram o sucesso da Copa.

O Brasil coopera com os serviços especiais russos na área de segurança? Está sendo levada em conta a experiência russa na realização dos Jogos Olímpicos de Inverno em Sôtchi?

É verdade que os nossos países têm muito em comum para a troca de experiência mútua. Enquanto a Rússia realizou os Jogos Olímpicos em Sôtchi, nós sediamos a Copa do Mundo. Agora, a situação se inverteu. O Brasil tem a Olimpíada, e a Rússia está se preparando para a Copa de 2018. Por isso, temos muito o que discutir e compartilhar. Eu sei que representantes dos serviços de segurança brasileiros visitaram várias vezes a Rússia, incluindo a infraestrutura olímpica e de transporte. Um dos focos foi na experiência de organização do sistema de segurança nos aeroportos de Moscou.

Alguns esportistas recusaram-se a participar dos Jogos Olímpicos porque têm medo do vírus da zika. Como o senhor avalia esses receios? Existe um risco real de os participantes dos Jogos serem infectados?

Respeito a decisão de cada atleta. Mas, quando falamos sobre a probabilidade geral de infecção pelo vírus da zika, percebo que as explicações para a sociedade internacional não foram suficientes. Queria sublinhar mais uma vez alguns fatores para afastar o medo. Primeiro, a região principal de difusão do vírus é o nordeste do país, não o Estado do Rio de Janeiro. Segundo, o principal grupo de risco são as mulheres grávidas. Evidentemente, mulheres grávidas não são aconselhadas a vir aos Jogos Olímpicos. Terceiro, estamos na época de inverno no hemisfério Sul. Este inverno tem sido bastante frio, do ponto de vista brasileiro, por isso, o número de mosquitos transmissores já caiu consideravelmente.

Armamento e tecnologia

Houve diversas declarações de que a Rússia estaria pronta para o fornecimento ao Brasil do sistema antiaéreo Pantsir-S1, mas esta decisão vem sendo adiada por motivos políticos e econômicos. O Brasil planeja adquiri-los? O senhor acredita que a assinatura do contrato será possível depois das Olimpíadas? E a opção de produzi-lo em território brasileiro?

Posso dizer que não se pode esperar a aquisição do Pantsir-S1 antes dos Jogos. Não é segredo que a economia brasileira demonstrou uma queda bastante séria no ano passado. Esperamos que neste ano a situação melhore. Mas é evidente que, por causa da diminuição da taxa de crescimento econômico, as receitas do governo federal também diminuíram. É claro que a queda das receitas do orçamento influenciou a redução de verbas destinadas ao Ministério da Defesa. O interesse de comprar o sistema Pantsir-S1 se mantém, como comprovam as visitas reiteradas de representantes de nossas Forças Armadas à Rússia. Espero que essas negociações sejam concluídas de maneira positiva. Neste momento, não posso responder à pergunta sobre eventuais prazos e outros detalhes de aquisição. Penso que agora ninguém poderá dar uma resposta precisa porque, além de problemas econômicos, o país também está enfrentando dificuldades políticas.

A Rússia frequentemente prefere produções conjuntas e transferência de tecnologia à simples venda de armamentos. O Brasil pretende desenvolver a cooperação nesse sentido e produzir materiais bélicos russos localmente?

Os primeiros passos nesse sentido já foram tomados. No caso dos helicópteros Mi-35, as partes já chegaram a acordo sobre a manutenção técnica. Pelo acordo, seria possível produzir alguns componentes no Brasil.

Companhias de petróleo russas também mostram interesse em participar de projetos brasileiros no setor. Há negociações hoje com alguma empresa russa?

O interesse da parte de companhias russas se mantém e está sobretudo focado na bacia do rio Solimões, na Amazônia.

Brics e contatos bilaterais

Levando em conta a atual situação política no Brasil, existe indicação de quem irá representar o país na Cúpula do Brics em Goa, em outubro? Há planos de uma reunião bilateral com o presidente russo Vladímir Pútin?

Quem vai representar o Brasil na cúpula depende da decisão de quem será o presidente. A segunda fase da análise das acusações no processo de impeachment de Dilma Rousseff deve ser concluída no Senado em agosto. Por isso, vamos esperar o que eles decidirão. De qualquer modo, posso dizer com certeza que, independentemente da figura que ocupará o cargo do Chefe de Estado – Dilma Rousseff ou Michel Temer –, ambos estão interessados em manter relações amistosas com a Federação Russa.

O presidente interino Michel Temer visitou a Rússia antes, inclusive sua última visita foi no ano passado, quando participou de encontros em Moscou com o primeiro-ministro Dmítri Medvedev. Estou certo de que, independentemente do futuro político no Brasil, os laços com a Rússia continuarão a ser desenvolvidos de maneira positiva. Com referência a um eventual encontro com Vladímir Pútin, incluindo no âmbito do Brics, posso dizer que encontros bilaterais são um formato habitual. Haverá, com certeza, encontros entre os líderes. Quem exatamente irá encontrar Pútin, o tempo dirá.

Já existe alguma reunião planejada entre chefes diplomáticos do Brasil e da Rússia?

A opção mais próxima possível será à margem da Assembleia Geral da ONU.

Fonte: Gazeta Russa


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