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IMAGINA DEPOIS DA COPA...

O Silverdome, um dos palcos da Copa de 1994, nos EUA, será leiloado neste mês. 
O problema é achar comprador (Foto: Carlos Osorio/ AP)

12/08/2014

O que os governos pretendem fazer com as arenas de Brasília, Manaus e Cuiabá – candidatas ao prêmio “ociosidade total” após o mundial. vem aí a operação antielefante branco

O lixo e os entulhos dominam as arquibancadas. Plantas e ervas daninhas proliferam pelo gramado que foi palco de jogos de Copa do Mundo, em 1994. O plástico que caiu das coberturas do teto está por toda parte. Não há energia elétrica para ligar as luzes. O abandono virou a marca registrada do Silverdome, estádio localizado em Detroit, nos Estados Unidos. No mês que vem, ele será leiloado. Há pouca expectativa de venda: o estádio, que já foi considerado um dos mais modernos do mundo, virou um elefante branco quando o time local de futebol americano, o Detroit Lions, mudou-se para outra arena, em 2001. Sem a renda trazida pela equipe, os proprietários não conseguem dinheiro para a manutenção. Se não houver interessados na compra, o estádio será demolido – é mais barato derrubá-lo e vender o terreno do que seguir pagando todo mês as despesas de um estádio vazio.

O Silverdome é um  triste exemplo do que pode ocorrer a algumas das arenas construídas no Brasil quando acabar a Copa do Mundo, este mês. Foram 12 estádios erguidos ou modernizados para a competição. Após o apito final, nove deles serão administrados por clubes com grande torcida ou por consórcios formados por empresas privadas. De modo geral, apesar de problemas localizados, não há muitas dúvidas sobre a utilidade desses locais. Já no caso das três outras arenas – Brasília, Manaus e Cuiabá – a situação é preocupante: sem a perspectiva de abrigar jogos com casa cheia, existe o risco de que elas sigam o exemplo do Silverdome, com os governos estaduais pagando pela manutenção de um estádio praticamente inativo. NEGÓCIOS procurou os administradores das três arenas – o Estádio Nacional, a Arena da Amazônia e a Arena Pantanal – para descobrir como eles pretendem viabilizar a operação. Nenhum deles quis se pronunciar. Executivos das três Secretarias Especiais da Copa 2014 (Secopas) revelaram, contudo, que neste momento está sendo desenhada uma operação antielefante branco para os estádios.

 (Foto: Reprodução)

Arena Multiúso 
Nos três casos, o objetivo é o mesmo: repassar o controle dos estádios à iniciativa privada por meio de um processo de concessão – os editais devem ser publicados no segundo semestre. “Antes mesmo do início das construções sabia-se que esses estádios eram inviáveis economicamente, o que afastou logo de cara o interesse de investidores”, diz um dos executivos. O que mudará após a Copa? O formato. Os governos irão estabelecer nos contratos uma série de atrativos – podem assumir parte da manutenção, cobrar um preço reduzido pela concessão e oferecer vantagens fiscais (desconto no ICMS para quem transferir o escritório da empresa para o estádio, por exemplo). “O desafio das empresas será obter renda para os custos de manutenção e ainda tentar fazer algum lucro”, diz o consultor Amir Somoggi. “Não vai ser fácil.”

O problema de construir estádios em cidades sem clubes fortes é a falta de recursos vindos do futebol. Um estudo da BDO revela que o público médio das partidas disputadas nessas cidades é de mil pessoas por jogo, o que deixaria as arenas com taxa de ociosidade superior a 98%. Com isso, não haverá renda para bancar a manutenção anual, que custa entre R$ 12 milhões e R$ 20 milhões. Na melhor situação, a do Estádio Nacional, em Brasília, o futebol deverá responder por 18% dos gastos (leia quadro na próxima página). O restante deverá sair do caixa dos governos estaduais.

A conclusão é que os grupos que assumirem a operação desses três estádios não poderão contar com o futebol para fechar a equação – diferentemente do que se faz em todo o mundo. Em média, um estádio moderno, como o Emirates, de Londres, recebe por volta de 35 partidas por ano, que geram 80% da receita com a venda de bilhetes e camisas e o consumo nas lanchonetes. As atividades periféricas – estacionamento, lojas, academias, shows, casamentos e até velórios –, somadas, são responsáveis por apenas 20% dos R$ 200 milhões anuais gerados pela arena. Já o estádio de Wembley dá prejuízo para a federação inglesa – sem um time operador, depende dos jogos da seleção ou de shows, que não pagam as despesas. “Estádio de futebol se rentabiliza com futebol. Esse papo de arena multiúso é balela”, diz Fernando Ferreira, da consultoria Pluri.

Na hora de elencar os planos que serão sugeridos aos investidores das três arenas, a criatividade impera – mas passa longe do modelo europeu. Em Mato Grosso, uma ideia é usar a Arena Pantanal para sediar os jogos do time local de futebol americano, o Cuiabá Arsenal – que leva uma média de 2,5 mil pessoas aos jogos, quatro vezes mais que a média regional do futebol “tradicional”. Manaus planeja receber a pré-temporada das grandes equipes europeias, explorando a atratividade da Amazônia para os estrangeiros. Também deve apelar à beleza da região para atrair eventos corporativos. Um desembargador local sugeriu até o uso do espaço como centro de triagem de detentos. Já em Brasília, a aposta é levar os jogos de grandes times brasileiros. No ano passado, o Estádio Nacional sediou uma das partidas com maior renda do país – R$ 6,9 milhões, no duelo entre Santos e Flamengo, que marcou a inauguração do estádio e a despedida de Neymar do Brasil. “Jogos-evento assim são uma exceção”, diz Pedro Daniel, consultor da BDO Brasil. Mesmo os shows musicais, sempre citados como a salvação da lavoura, também são insuficientes. Uma arena dificilmente recebe mais de R$ 1 milhão pelo aluguel do espaço; seriam necessários, portanto, pelo menos 15 shows por ano para pagar as contas. O Morumbi, palco esportivo mais procurado do país para eventos de entretenimento, teve apenas três shows de grande porte no ano passado. Haja criatividade para espantar o elefante.

(Foto: Portal da Copa)




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